‘Trash’ Review: Para inglês ver

brasilobserver - mar 17 2015
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(Read in English)

Por Gabriela Lobianco

Trash – A esperança vem do lixo revela a visão política de um britânico sobre o Terceiro Mundo, seus governantes e sua pobreza. O Brasil de Stephen Daldry, porém, é fictício – mesmo que o diretor tenha morado no país durante os últimos dois anos, para tocar o projeto de adaptação do livro homônimo de Andy Mulligan.

O best-seller foi baseado nas experiências do escritor ao ensinar inglês e teatro em quarto lugares: Índia, Filipinas, Vietnã e Brasil. Por questões de logística, Daldry e o roteirista Richard Curtis, em parceria com a O2 de Fernando Meirelles, optaram pelo cenário tupiniquim para narrar a saga dos amigos Rafael, Gardo e Rato para o cinema.

A história percorre as aventuras e desventuras de três garotos da favela que encontram uma carteira no lixão em que trabalham, e que passam a se envolver numa trama de caça ao tesouro, com ações de uma polícia corrupta e a ajuda divina na forma de um padre gringo.

Como o diretor teve seus quatro filmes anteriores indicados ao Oscar (Billy Elliot, As Horas, O Leitor e Tão Forte e Tão Perto), houve grande expectativa sobre o projeto de rodar um filme no Brasil, falado em português e com a presença dos atores americanos Martin Sheen e Rooney Mara no elenco. Mas o tiro saiu pela culatra.

Em Billy Elliot, as câmeras captam com sagacidade o desconforto desajeitado que o bailarino Billy tinha com o pai inglês – um incômodo inerente ao comportamento dos ingleses e sua cultura. É justamente essa perspectiva de quem faz parte e não de quem é espectador que falta no filme Trash – A esperança vem do lixo.

Stephen Daldry deixa a desejar por não ter bagagem cultural para mostrar em cenas um Brasil menos estereotipado. Falta-lhe convencimento, com desenvoltura e intimidade, para retratar a pobreza marginalizada daqueles meninos que querem ser a esperança de um futuro melhor como alegoria àquele suposto país cheio de policiais e políticos corruptos. Mesmo a competência de Sheen como ator fica insuficiente ao interpretar o padre Juilliard – seu esforço para falar português acaba por ser mecânico e o sentimento de indignação que o personagem exige, se perde na tela.

No fim, a mise-en-scène do filme se resume a uma mistura de artigos sobre países emergentes como Quem quer ser milionário? ou o próprio Cidade de Deus, do Meirelles. Apesar do alto orçamento, Trash – A esperança vem do lixo foi feito mesmo só para inglês ver.

 

BRASIL OBSERVER – EDIÇÃO 25