Do estigma à estima

brasilobserver - jul 20 2015
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O plano começa com um documentário sobre o primeiro treinamento em uma comunidade pobre de Recife (Foto: Juana Carvalho)

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Projeto propõe mudança social de baixo para cima através do desenvolvimento do pensamento crítico e da capacitação técnica em comunidades carentes

 

Por Alicia Bastos*

Estamos tão acostumados a tirar fotos e publicá-las online instantaneamente que mal nos lembramos de quando descobrimos uma câmera pela primeira vez e como isso mudou nossas vidas. E se uma câmera fotográfica fosse um desejável pedaço do impossível?

Crianças desfavorecidas de todo o mundo, particularmente em áreas urbanas, são negligenciadas. Discriminadas, elas têm oportunidades limitadas para desenvolver habilidades e obter sucesso na vida. No Brasil, apesar do avanço econômico das últimas décadas, a pobreza ainda é bastante presente. Em 2014, o governo anunciou que os números relativos à pobreza extrema aumentaram de 10.080.000, em 2012, para 10.450.000, em 2013, enquanto a população passou de 195 milhões pessoas, em 2010, para 203 milhões, em 2015.

Enquanto creches, escolas e oportunidades de trabalho têm sido o foco do governo brasileiro para combater a pobreza, os jovens e as crianças não possuem capacidades práticas e úteis que podem envolvê-los na formação técnica e oportunidades profissionais.

A partir dessa avaliação, a antropóloga brasileira e cineasta Giselle Oliveira fundou o ‘Eyes of the Street’ (Olhos da Rua) com o jornalista brasileiro Daniel Meirinho, que possui um PHD e é especializado em cultura jovem e mídia digital com enfoque social. Juntos, eles estão embarcando em uma missão para transformar a vida de crianças pobres no Brasil e em outras regiões desfavorecidas do mundo, ensinando técnicas fotográficas e de filmagem e fomentando o desenvolvimento do pensamento crítico. Também querem criar uma plataforma online onde as crianças podem compartilhar experiências.

“Pobreza e desigualdade podem ser conceitos do nosso tempo, assim como são criatividade e inovação. Acreditamos que todos são capazes de criar a mudança quando têm poder das ferramentas que ampliam suas vozes e nutrem seus potenciais humanos”, diz Giselle Oliveira.

O plano do ‘Eyes of the Street’ começa com um documentário sobre o primeiro treinamento em uma comunidade pobre de Recife. Em seguida, a ideia é fazer circular esse documentário para ganhar atenção e fundos para continuar o trabalho em outras comunidades.

Projetos como esse já foram feito antes; o modelo é testado e funciona. Um bom exemplo é o documentário Nascidos em Bordéis (2004), assim como o projeto Vídeo nas Aldeias, que formou fotógrafos e cineastas indígenas como Takumã Kuikuro, que esteve recentemente em Londres filmando seu novo projeto cinematográfico.

Os resultados de projetos desse matiz podem ser significativos. Além de possibilitar que essas crianças desenvolvam habilidades que mais tarde podem ser transformadas em atividade profissional, a possibilidade de compartilhar histórias pode ser um passo sólido contra a desigualdade, trabalhando a compaixão e a consciência.

“Acreditamos que uma maneira de combater a pobreza urbana de forma sustentável é capacitando as comunidades para permitir a transformação liderada por elas localmente”, explica Giselle.

Outra missão fundamental do projeto é o desenvolvimento do pensamento crítico juntamente com a criatividade, transformando as comunidades pobres em centros criativos e de inovação. Não só o conhecimento de criar imagens é essencial para fazer parte de um mundo evolui em sua forma de comunicação, mas também a conexão com outras realidades pode ser muito importante para mobilizar estratégias de baixo para cima e com foco nas mudanças sociais.

‘Eyes of the Street’ está realizando uma campanha de financiamento coletivo para produzir o documentário em 2015. O documentário tem previsão de lançamento na capital de Pernambuco, em Londres e em festivais internacionais em 2016. Para apoiar: http://bit.ly/1HGROM7.

 

*Alicia Bastos é fundadora do Braziliarty (www.braziliarty.org)

BRASIL OBSERVER – EDIÇÃO 29

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