A tarifa do transporte coletivo em Santos vai subir no domingo, dia 24, dos atuais R$ 2,90 para R$ 3,25, notícia que gerou grande repercussão (negativa) nas redes sociais e na cidade.
Em Curitiba, a cada semana gradativamente a integração tarifária com a região metropolitana vem sendo desfeita. Além de agora ter de pagar no mínimo duas passagens para ir de um município a outro, o usuário precisa de fazer mais baldeações.
São dois exemplos práticos, recentes, de um problema que existe desde sempre e que o poder público, nas três esferas (federal, estadual e municipal) e instâncias (executivo, legislativo e judiciário), com raras e honrosas exceções reluta em enfrentar.
Esse problema é o oligopólio no transporte coletivo urbano no Brasil. Ou, como definiu a revista Caros Amigos em reportagem sobre o assunto, trata-se do “Cartel da Catraca”, dominado pelos “Barões do Asfalto”.
Em torno de meia-dúzia de conglomerados de viações detém a maior parte da frota de linhas municipais e metropolitanas em capitais e cidades de médio porte, de todas as cinco regiões do país.
São empresas e empresários poderosos, com lobby e influência fortíssimos sobre prefeitos, vereadores, deputados, desembargadores e juízes, e também sobre a imprensa, em regra.
São empresas e empresários que há décadas lucram com tarifas que consomem fatia considerável do salário do trabalhador.
São empresas e empresários que constituíram e expandiram seus negócios em tempos quando a concessão de serviços públicos era obtida sob regras menos rígidas que as estabelecidas pela Constituição de 1988. E, depois do marco constitucional, tais impérios conseguiram se manter – e continuar a crescer – vencendo processos licitatórios muitas vezes questionáveis.
É difícil fazer um levantamento do tamanho exato desses grupos, porque as ramificações de cada um são inúmeras, e nem sempre identificáveis claramente. Mas é possível constatar que estes seis estão entre os maiores e os mais onipresentes:
- GRUPO ÁUREA ou Grupo Constantino, ou ainda Comporte Participações. Conglomerado formado por diversas viações que operam principalmente em Santos e Baixada Santista, várias cidades do interior de São Paulo e norte/noroeste do Paraná, e no Distrito Federal. O grupo é o controlador da Gol Linhas Aéreas e da BRVias (concessões de rodovias), entre outros negócios.
- GRUPO RUAS, formado por viações que operam sobretudo em São Paulo capital. Faz parte do grupo ainda a carroceria Caio.
- GRUPO GUANABARA, com empresas de ônibus que operam no Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Ceará, Pará, Paraíba e Piauí. Também tem uma viação em Portugal, além de outros negócios no Brasil e naquele país.
- GRUPO BELARMINO, presente em São Paulo e região metropolitana, em Campinas, Jundiaí, Franca e São João da Boa Vista. Entre outros negócios, é sócio na Pastifício Selmi, fabricante dos macarrões Galo e Renata.
- GRUPO ABC, com predomínio no Grande ABC Paulista, incluindo a operação do corredor metropolitano Jabaquara-São Mateus, via cidades do ABCDM.
- GRUPO GULIN, com participação em quase 70% dos consórcios que operam em Curitiba; presente também no interior do Paraná e no Distrito Federal.
Também é de se incluir na lista das mais poderosas as viações do empresário Wagner Canhedo (atuação no Centro-Oeste) e de Clésio de Andrade (Belo Horizonte, sobretudo).
Voltemos ao início deste texto.
O reajuste na tarifa de Santos vem depois que o Grupo Constantino, com a Viação Piracicabana, venceu pela terceira vez consecutiva processo licitatório para operar, sozinha, o transporte municipal. Um processo licitatório, diga-se de passagem, que chegou a ser suspenso pelo Tribunal de Contas do Estado. Na cidade desde 1998, a Piracicabana terá mais oito anos de contrato – portanto, completará um quarto de século monopolizando o setor em Santos.
O Grupo Constantino obteve no ano passado também a concessão para operar a linha de Veículos Leves sobre Trilhos (VLTs) que está sendo implementada em Santos e São Vicente, em licitação promovida pelo Governo do Estado de São Paulo.
Quanto à extinção da integração tarifária das linhas da região de Curitiba, é resultado do fim do subsídio que era feito pelo Governo do Estado do Paraná ao sistema, operado pela Prefeitura de Curitiba. O empresariado de ônibus alega que sem o subsídio não sustenta a integração. Além desse problema, há outro: o envelhecimento da frota. A última renovação ocorreu em 2012; o sindicato que representa as empresas conseguiu na justiça suspender a obrigação de adquirir ônibus novos para substituir carros com mais de dez anos de circulação.
Entre enfrentar as empresas ou sacrificar os passageiros, vemos que a opção tem sido pela mais cômoda.
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Por Wagner de Alcântara Aragão, jornalista e professor | Twitter: @waasantista
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