Desde o final da tarde desta terça-feira, dia 10, a Assembleia Legislativa do Paraná está ocupada por centenas de manifestantes.
A maioria deles professores e funcionários de escolas estaduais e estudantes, mas há trabalhadores de outras categorias também, e pais de alunos.
Cerca de 300 já estavam, devidamente autorizados pela Casa, nas galerias da Assembleia, desde por volta das 14h30.
Era o público que acompanhava a sessão de votação de dois projetos de lei enviados pelo governador Beto Richa (PSDB) – o chamado “pacote de maldades”.
(O apelido do pacote já denota seu conteúdo. Mais abaixo falamos sobre isso)
Depois de mais de três horas de debates entre os parlamentares, foi colocado em votação se, para a apreciação dos projetos, o plenário seria transformado em “comissão geral”.
Esse instrumento de “comissão geral” só existe no Paraná. Nenhuma outra Assembleia Legislativa de qualquer outro Estado conta com isso.
A “comissão geral” substitui todas as outras comissões pelos quais um determinado projeto deve tramitar antes de ir a plenário.
Essa tramitação por comissões específicas permite que o Legislativo exerça sua função – a de analisar cada proposta, realizar audiências públicas, verificar possíveis correções etc.
Com a “comissão geral” nada disso ocorre.
Por isso esse instrumento foi apelidado de “tratoraço”. Os projetos não são apreciados, são atropelados, aprovados sem que haja de fato uma análise criteriosa.
Pois bem, assim que a votação foi concluída e o painel apontou a vitória de goleada (34 votos pela “comissão geral” ante 19 contra) os ânimos nas galerias, exaltados desde o início, explodiram.
Espectadores começaram a pular dos balcões para o plenário. Os milhares de manifestantes que acompanhavam tudo do lado de fora, como uma tsunami humana romperam portões, portas e grades e ocuparam as instalações da Assembleia Legislativa.
Dos deputados, só ficaram por ali os contrários ao pacote. Os parlamentares da situação, rapidamente conseguiram escapar, e deles não se tinha mais sinal.
O estopim, como se viu, foi a primeira derrota do dia – a instalação da “comissão geral”. Pelo resultado, anteviu-se que o “pacote de maldades” fatalmente seria aprovado.
Na real, porém, a reação que levou à ocupação da Assembleia Legislativa é resultado de uma sucessão de medidas impopulares, de arrocho, que o governo tucano do Paraná vem tomando desde que Beto Richa se reelegeu em outubro último, no primeiro turno.
Foi só a gota d’água.
Utilizando-se do instrumento da “comissão geral”, a Assembleia Legislativa aprovara, no final do ano passado, aumento de IPVA e de ICMS (o famoso “tarifaço”).
Especificamente na área de educação, detonantes decisões também têm se sucedido nos últimos meses.
Do final de 2014 para cá, o governo estadual não pagou salários dos professores e funcionários temporários das escolas, e ainda demitiu todos. Em janeiro último, não pagou o terço de férias dos professores e funcionários efetivos.
Neste começo de ano, diminuiu o chamado porte das escolas. Com isso, as equipes foram cortadas drasticamente. Há colégios, por exemplo, com um inspetor só para cuidar de três turnos. Equipes pedagógicas reduzidas à metade.
Cerca de 4 mil profissionais que passaram em concursos de anos anteriores foram chamados pelo governo estadual no final do ano passado para a distribuição de aulas. No começo deste ano, todavia, o mesmo governo suspendeu as nomeações.
Sobre o “pacote de maldades”
Não bastasse toda essa bagunça, veio agora em fevereiro o tal “pacote de maldades”.
O projeto de lei complementar de número 6/2015 é o que dá o apelido ao pacote.
O projeto, aliás, é uma salada só: trata ao mesmo tempo da criação de um fundo de previdência complementar para os servidores, retira direitos garantidos pelos planos de carreiras de professores e funcionários das escolas e diminui drasticamente o adicional por tempo de serviço dos demais servidores do Poder Executivo.
Na prática, em suma, se aprovado o projeto:
- 1) Vai diminuir a remuneração de todo o funcionalismo, e mais ainda a dos professores e funcionários das escolas
- 2) Extingue níveis e classes salariais da tabela de remuneração dos professores da rede estadual de ensino
- 3) Retarda e restringe a ascensão na carreira (promoções e progressões), com prejuízos salariais, tanto de professores como dos demais funcionários das escolas
- 4) Vai diminuir a aposentadoria do servidor que não optar pelo fundo complementar
- 5) Vai colocar em risco a capacidade de o Estado manter o pagamento das aposentadorias e pensões do funcionalismo
Tudo isso, segundo o governador tucano, para cortar despesas do Estado.
Alegam, o governador e os deputados da situação, que as finanças do Estado estão críticas, e que o momento é de ajustes, de sacrifícios.
Entretanto, os dados sobre as receitas do Estado do Paraná mostram que a arrecadação cresceu nos últimos quatro anos.
De acordo com matéria do jornalista André Gonçalves, da Gazeta do Povo, entre dezembro de 2010 e abril de 2014, a receita corrente líquida do Estado do Paraná cresceu 56%.
Bem mais que a inflação (medida pelo IPCA) no período (de 24%).
A arrecadação do Estado do Paraná passou de R$ 16,97 bilhões/ano para R$ 26,41 bilhões/ano.
O Paraná, por sinal, foi o Estado que mais cresceu em arrecadação.
Os professores e funcionários das escolas mantêm a greve, iniciada na segunda, dia 9. Outras categorias estão se somando ao movimento.
E os manifestantes vão seguir ocupando a Assembleia Legislativa e acampados do lado de fora até que o governador retire o pacote.
Dada as circunstâncias, não parece haver outra saída para o Executivo estadual.
A conferir.
Por Wagner de Alcântara Aragão, jornalista e professor | Twitter: @waasantista
| Foto: Sandro Nascimento/Alep
| Postado de Curitiba