Eumir Deodato, o mestre arranjador

Brasil Observer - mar 17 2017
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Músico brasileiro conversa com o Brasil Observer antes de vir a Londres para duas apresentações no Ronnie Scott’s

 

Por Gabriela Lobianco

Carioca erradicado nos Estados Unidos, Eumir Deodato é um versátil compositor, arranjador e instrumentista que se apresenta quase todos os anos no Ronnie Scott’s, renomado clube de jazz da capital britânica.

Apesar de um currículo tarimbado, com participações em mais de 500 álbuns entre arranjos e composições, além de um Grammy na prateleira, Eumir é muito acanhado e fala de sua trajetória com bastante simplicidade e naturalidade. “Sempre me apresento com a orquestra própria do Ronnie Scott’s. Prefiro me apresentar ao ar livre, mas especialmente agora, no inverno, acabo por me render aos clubes”, disse em uma conversa exclusiva via Skype com o Brasil Observer.

Nesta temporada, o concerto conta com a participação de Dom Glover no trompete, Dave Williamson no trombone, Ben Castle no saxofone barítono e na flauta, Ronan McCullagh na guitarra, Andrew McKinney no baixo, Pat Illingworth na bateria e Snowboy na percussão. Segundo Deodato, trata-se de um espetáculo simples, mas bem ensaiado e pensado, com mistura de jazz e ritmos esfuziantes. Acrescenta ainda que o público que normalmente o reverencia é mesclado entre estrangeiros e brasileiros, não apenas imigrantes, mas de viajantes. “Apesar da crise, né?”, brincou. E foge de comentar questões sérias como a questão dos imigrantes nos Estados Unidos ou o Brexit. “Não tenho seguido muito, não”.

 

TRAJETÓRIA

Autodidata, Eumir Deodato iniciou a carreira aos 12 anos tocando acordeão. Dedicou-se em seguida aos estudos de piano, arranjos e regência em orquestra. Ficou famoso em 1973 com o álbum Prelude, que gravou ao vivo no Madison Square Garden, em Nova York. Principalmente com a faixa “Also Sprach Zarathustra”, mundialmente conhecida como o tema do filme “2001: Uma Odisséia no Espaço”. Foi a primeira de inúmeras trilhas sonoras para as quais trabalhou em Hollywood, como em “Os Aventureiros”, do britânico Lewis Gilbert, com a atriz norte-americana Candice Bergen no elenco, ou mesmo sua composição “Spirit of the Summer”, que acabou parte da trilha sonora do filme “O exorcista”.

Eumir é também lembrado por ter trabalhado na década de 1960 com renomados artistas da Música Popular Brasileira, como Antônio Carlos Jobim, César Camargo Mariano, Baden Powell, Chico Buarque, Elis Regina e Vinícius de Moraes. Inúmeras colaborações que levaram a outras. É o caso da música “Travessia”, de Milton Nascimento, que em 2017 completa 50 anos, que acabou possibilitando parcerias com artistas do calibre da islandesa Björk. “É verdade, a conheci devido ao arranjo [da música] que fiz para o Festival [Internacional da Canção de 1967, da TV Globo]. É espetacular, trabalhamos num estúdio na Espanha com músicos excelentes, como o baterista português Luís Jardim”, relembra.

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Além disso, Eumir participou do movimento musical que surgiu na década de 1960 em Minas Gerais e culminou no disco Clube Da Esquina, que completa 45 anos em 2017. O movimento fundia inovações da Bossa Nova e elementos de Jazz, Folk e Rock – com grande influência dos Beatles –, além de música folclórica erudita e hispânica. Milton Nascimento e os irmãos Borges (Marilton, Márcio e Lô) lideravam o clube, do qual Eumir também fez parte. “Participei do álbum, mas fiz as coisas que já sabia que o Milton tinha feito. Ele me passou a música, eu fiz o arranjo, somente um de cordas que ficou muito bonito. O resto do álbum foi feito no Rio de Janeiro e eu depois voltei para Nova York”, explica.

Quando indagado sobre o sucesso desse disco emblemático, Eumir diz que não tem muita responsabilidade pelo sucesso. “Tem coisas muito bonitas feitas pelo Lô Borges, pelo resto da turma que trabalhava com o Milton naquela época e ainda trabalham com ele”. E revela que já não tem contato com esses músicos e artistas: “não tenho mais notícias do Milton Nascimento há muitos anos já. Ele está bem?”, questiona.

 

VIDA NO EXTERIOR

Depois que Prelude vendeu milhões de cópias, se estabelecendo no terceiro posto da Billboard, a carreira de Eumir Deodato decolou. No mesmo disco, abrasileirou com o estilo Bossa Nova “Afternoon of a Faun”, de Claude Debussy. Depois disso, teve a oportunidade de trabalhar com vários artistas consagrados: foi arranjador de Frank Sinatra, Roberta Flack, Aretha Franklin, Kool and The Gang, entre inúmeros outros.

Quem puder comparecer ao Ronnie Scott’s este mês para apreciar o som de Eumir Deodato não vai se arrepender.