O que o Brexit e a ascensão de Theresa May significam para as mulheres latino-americanas que vivem no Reino Unido?
Por Carolina Gottardo
O voto pela saída do Reino Unido da União Europeia provavelmente terá um impacto negativo sobre as mulheres latino-americanas que vivem no país. Como mostra nosso recém-lançado relatório Towards Visibility, muitas mulheres latino-americanas residem no Reino Unido com passaporte europeu. O Brexit tem aumentado os níveis de ansiedade e incerteza que muitas de nós sentimos como imigrantes em um país onde a política foi manchada por uma retórica negativa em relação à imigração, assim como pela real deterioração dos direitos dos imigrantes. Mais do que nunca é importante agora continuar lutando pelos nossos direitos.
Outro efeito preocupante tem sido o aumento dos casos de racismo e sexismo após o referendo. Temos recebido na LAWRS (Latin American Women’s Rights Service) muitos relatos de mulheres e meninas latino-americanas vítimas de ódio racial e sexual no trabalho e na escola. Isso não acontecia com frequência – o aumento dos casos é alarmante.
A ascensão de uma primeira-ministra mulher vai mudar as coisas para melhor? Não no caso de Theresa May. Uma das pessoas que permaneceu por mais tempo à frente do Ministério do Interior (de 2010 a 2016), May realizou algumas ações positivas em certas áreas. Ela acumula, porém, um histórico espantoso no que diz respeito aos direitos dos imigrantes.
Do lado menos negativo, May demonstrou interesse pela área de violência contra mulheres e meninas com um plano de ação para lidar com questões como violência baseada na honra, casamento forçado, mutilação genital feminina, entre outras. No entanto, demonstrar interesse pelos direitos das mulheres não é suficiente quando se leva em consideração que esses direitos deveriam ser aplicados a todas as mulheres independentemente da raça e do status imigratório. Não é suficiente ter uma sociedade onde algumas podem exercer seus direitos e outras não. Os direitos das mulheres devem estar acima do controle imigratório.
Theresa May é a mulher que trouxe o Modern Slavery Act e tem se mostrado comprometida na luta contra o tráfico humano (embora o projeto tenha muitas brechas e não enfrente a exploração endêmica que afeta muitas mulheres latino-americanas que vivem no Reino Unido).
Do lado mais assustador, Theresa May tem sido uma das mais ferozes oponentes dos direitos dos imigrantes. Ela foi a mulher por trás das vans “go home” que trouxeram tantas tensões para a comunidade latino-americana, violando flagrantemente os direitos dos imigrantes. Ela também encorajou uma política hostil contra os imigrantes e está por trás do Immigration Act 2016, que criminaliza imigrantes sem documentos e converte landlords e autoridades de saúde em oficiais de controle. Mesmo durante sua curta campanha pela liderança do Partido Conservador, May usou os direitos dos imigrantes europeus como parte da negociação.
Theresa May é uma mulher, mas de forma alguma ela é uma feminista, muito menos alguém que se importa com os direitos de todas as mulheres independentemente de raça, condição física, idade ou status imigratório. É positivo ter uma mulher na liderança de um sistema político dominado por homens, mas Theresa May não é aquela que vai responder pelas necessidades das mulheres e das meninas ou nos ajudar a exercitar nossos direitos. Pelo contrário, ela ficará feliz em reduzir a entrada de imigrantes o máximo possível e em pechinchar com nossos direitos.
O que precisamos é de uma liderança feminina que também seja feminista, e que acredite que os direitos das mulheres são direitos humanos independentemente do status imigratório, de modo que possam ser aplicados a todas. É tão difícil assim entender este princípio universal?
- Carolina Gottardo é diretora da Latin American Women’s Rights Service (LAWRS) – www.lawrs.org.uk