Um mundo em que todos nós habitamos é apresentado por artistas de Pernambuco através de narrativas que são tão particulares quanto universais, diz curadora da exposição
Por Beth da Matta
O estado de Pernambuco há muito tempo é reconhecido como um rico território em produção cultural e artística. Nomes emblemáticos estão gravados na memória e fazem parte da história do experimentalismo tanto no fazer da arte quanto no desenvolvimento de trabalhos críticos e literários que refletem o Brasil e o nordeste.
Criadores como Ariano Suassuna, Cícero Dias, Vicente do Rego Monteiro, Francisco Brennand, Gilberto Freyre, João Cabral de Melo Neto, Clarice Lispector e Chico Science contribuíram – e ainda contribuem – para a construção de uma fisionomia do nordeste e do sertão, assim como para a cultura e subjetividade de seus habitantes.
Diversos artistas visuais de Pernambuco alcançaram proeminência nacional e internacional, revelando em seus trabalhos a herança e a novidade de um Brasil criativamente efervescente e, consequentemente, atraindo a atenção de especialistas e do público em geral para as diversas formas poéticas presentes em suas obras.
Em meados da década de 1990, a produção artística pernambucana – principalmente filmes, músicas e artes visuais – se expandiu além dos temas regionais, tomada pela globalização econômica e cultural, influenciada pelo desenvolvimento tecnológico e pela pesquisa. Ao passo em que artistas rompiam as fronteiras de Recife, assim como o foco de seus trabalhos, a capital do estado também dava as boas-vindas para críticos e artistas de outras regiões do Brasil e do mundo.
A dinâmica da arte, por óbvio, está sempre mudando. A crescente circulação de produções artísticas por feiras e exposições internacionais tem dado maior visibilidade a algumas áreas da produção artística pernambucana, materializada de diversas formas.
Os repertórios, procedimentos e materiais desses artistas agem como um amplificador para a região, que é ao mesmo tempo local e internacional. Descobrimos ramificações, ecos e reverberações de suas produções em outros países, o que contribui para uma reimaginação local e internacional do que o Brasil, o nordeste e o sertão podem ser.
A jornada de criação na qual esses artistas pernambucanos embarcaram – e que apresentamos agora nessa exposição Art from Pernambuco – foi e ainda é um convite atraente à descoberta de uma linha comum de experimentalismo como forma de representar a si mesmo e ao seu mundo.
Com audácia e originalidade na escolha e no uso dos materiais, e também do repertório e dos temas abordados, os artistas selecionados revelam criativamente uma atitude experimental em relação à arte e ao meio artístico.
A exposição tem o intuito de apresentar importantes artistas visuais e várias formas de artes produzidas em Pernambuco, e ao mesmo tempo iniciar um debate sobre a multiplicidade dessa produção poética e desses artistas.
DIFERENTES GERAÇÕES
Cobrindo quatro gerações, a exposição reúne obras de 17 artistas criadas em várias formas diferentes. Daniel Santiago, Eudes Mota e Paulo Bruscky representam o experimentalismo da década de 1970. Sebastião Pedrosa – um professor de teoria da arte na Universidade Federal de Pernambuco, onde ele lecionou por quase três décadas – investiga outros meios de expressão, como pinturas.
Gil Vicente e Renato Valle, que eram muito novos nos anos 1970, começaram com pinturas e depois migraram para desenhos e gravuras nas décadas seguintes.
Dos anos 1980 em diante, Marcelo Silveira, Márcio Almeida, Oriana Duarte, Paulo Meira e José Paulo, herdeiros da geração conceitual dos 1970, rompem com a tradição ao explorar as fronteiras da linguagem, da gramática e do campo semântico da própria arte.
E finalmente descobrimos a linha artística pós-milênio através das ações e atitudes de Lourival Cuquinha; das relações entre corpo e natureza de Rodrigo Braga; da mitologia de Bruno Vilela e Amanda Melo; e da experimentação gráfica de Kilian Glasner e Jeims Duarte.
É possível ver – através de observação cuidadosa e atenta – essa hibridez temporal, geográfica e cultural. Falando deles mesmos e de Recife, os artistas simultaneamente comunicam temas globais. Ou seja, um mundo em que todos nós habitamos é apresentado por artistas de Pernambuco através de narrativas que são tão particulares quanto universais. É um mundo de hibridez, de mistura, de fluídos temporais; um mundo que produz diversas práticas culturais.
*Beth da Matta é curadora da exposição e diretora do Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães, de Recife
ART FROM PERNAMBUCO
Quando: Até 28 de Fevereiro – Terça à Sábado, 11am-6pm
Onde: Sala Brasil – 14-16 Cockspur Street (SW1Y 5BL)
Entrada: Gratuita
Info: www.culturalbrazil.org