Eleições 2016: Poucas chances para o novo

Brasil Observer - set 08 2016
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Brasileiros vão às urnas dia 2 de outubro para escolher prefeitos e vereadores. Novas regras eleitorais, porém, não tendem a favorecer renovação política

 

Por Wagner de Alcântara Aragão

Uma campanha mais curta, mais discreta e, em tese, mais barata. É o que se espera das eleições municipais deste ano, depois da minirreforma eleitoral aprovada pelo Congresso Nacional em 2015. Apesar de alguns avanços – como o fim do financiamento empresarial de campanhas –, as mudanças devem frustrar aqueles quem almejam renovação política e práticas mais legítimas e éticas.

Para o cientista político Emerson Urizzi Cervi, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o tempo menor de campanha se torna um obstáculo para que candidatos menos conhecidos consigam se comunicar e expor suas propostas para o eleitor. A campanha deste ano (iniciada em 16 de agosto) terá 45 dias de duração, metade dos 90 dias das eleições anteriores. Além disso, a propaganda eleitoral no rádio e na televisão também foi reduzida.

“[As mudanças na legislação eleitoral] beneficiam aqueles que já são conhecidos. Assim, ou o eleitor vota naquele que está disputando a reeleição ou as opções são esportistas, figuras dos meios de comunicação ou religiosos, que já são conhecidos”, assinala Cervi, em entrevista ao Brasil Observer. “O que a reforma eleitoral fez foi diminuir as opções reais para o eleitor. Depois não adianta reclamar da alta taxa de reeleição ou do crescimento de pastores na política”, critica o professor da UFPR.

 

DEBATES

Dos debates eleitorais, principalmente aqueles promovidos por emissoras de televisão, dificilmente se deve esperar um foro consistente de discussão de ideias e propostas. A começar pelo horário em que são realizados e transmitidos – geralmente depois das 10pm, avançando pelo início da madrugada. A maior parte da população, que precisa acordar cedo para trabalhar e estudar, acaba não tendo condições de acompanhar esses encontros.

Além do horário pouco adequado, as regras costumam engessar as discussões. O que se têm, normalmente, são exposições curtas feitas pelos candidatos, ensaiadas com assessores, dentro de temas preestabelecidos e generalistas. Apenas no segundo turno há maior possibilidade de confrontos, mas dos 5.568 municípios brasileiros, só 92 contam com mais de 200 mil eleitores, onde é possível ocorrer uma segunda votação entre os dois candidatos a prefeito com maior número de votos no primeiro turno.

 

PARTICIPAÇÕES

A minirreforma eleitoral aprovada em 2015 também tornou a participação de candidatos nos debates mais restrita. Pela nova legislação eleitoral, os organizadores dos debates só são obrigados a convidar candidatos de partidos com mais de nove parlamentares na Câmara dos Deputados. A inclusão de nomes de agremiações que não atendam a esse requisito dependia da concordância dos concorrentes. Essa restrição chegou a ser derrubada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 25 de agosto último – quando a Corte julgou procedentes quatro ações diretas de inconstitucionalidade que questionavam tal limitação.

“A possibilidade de a emissora convidar para debate eleitoral candidato não apto pela lei, sem a necessidade da concordância dos demais candidatos, pode sim trazer maior densidade democrática ao processo eleitoral”, declarou o ministro do STF Dias Toffoli, relator das ações, junto com a ministra Rosa Weber. “A regulação normativa não pode comprometer o debate público, sob pena de transgredir a democracia deliberativa, o que culminaria por aniquilar o direito básico que impõe ao Estado respeito ao princípio de igualdade de oportunidades”, acompanhou o ministro Celso de Mello.

Mesmo assim, em dois dos principais debates de televisão, promovidos pela emissora Band em São Paulo (no dia 22 de agosto) e no Rio de Janeiro (no mesmo dia 25 da apreciação das ações pelo STF), os candidatos do Psol – Luiza Erundina, na capital paulista, e Marcelo Freixo, no Rio – não puderam participar. Vale ressaltar que tanto Erundina quanto Freixo são apontados por pesquisas de opinião como fortes concorrentes nas respectivas disputas.

 

CONJUNTURA

Não bastasse o período menor de campanha eleitoral, o começo dela coincidiu com o momento em que as atenções do país no campo político estavam voltadas para o julgamento do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff.

Em que pese esse contexto, o cientista político Emerson Cervi acredita que a conjuntura nacional não deve ter impacto mais significativo no pleito de outubro próximo. “Não creio. As eleições são municipais, onde as questões nacionais estão muito distantes para mais de 90% dos municípios”, afirma ao Brasil Observer. “No Brasil, 50% dos municípios têm até 20 mil eleitores, ou seja, são muito pequenos e a eleição municipal serve para discutir as questões locais. Dos quase 5.600 municípios apenas 92 têm segundo turno, ou seja, é uma eleição em que as disputas dos grupos locais importam mais que a conjuntura nacional.”

 

ESPECTROS

Diante do impeachment da presidente Dilma Rousseff e do ressurgimento das forças de centro-direita e direita, que espectro político deve sair fortalecido das eleições municipais de outubro? De acordo com o professor da UFPR, difícil cravar um diagnóstico. “Em geral a esquerda está com um discurso cansado no Brasil, assim como no resto do mundo. Na Europa a extrema direita cresce no descontentamento do cidadão comum. No Brasil o fenômeno é parecido”, compara Cervi.

A pulverização partidária, realidade brasileira, complica traçar uma projeção. Todavia, o momento parece mais favorável às forças conservadoras. “Como há muitos partidos [disputando as eleições municipais], não é possível antecipar qual deles deve ter vantagem. O que se espera é [maior vantagem para] os pequenos e médios partidos de centro-direita e direita”, aponta o cientista política.

 

LIDERANÇAS

Uma constatação praticamente unânime entre os analistas políticos é a escassez de lideranças marcantes – pior que isso, a absoluta falta de perspectivas de surgimento de novas, em curto prazo. O atual prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), que tenta a reeleição, e do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB), costumam ser apontados como lideranças potenciais – por administrarem as duas maiores cidades do país.

A consolidação dessa força, no entanto, vai depender do desempenho de ambos nas eleições deste ano. Haddad, segundo as primeiras pesquisas eleitorais, terá dificuldade para se reeleger – Celso Russomano (PRB) e a ex-prefeita Marta Suplicy (PMDB) lideram a disputa; o atual prefeito divide a terceira colocação com a também ex-prefeita Luiza Erundina (Psol). Mas o chefe do Executivo paulistano tende a crescer no decorrer da campanha e, passando ao segundo turno, chega com força.

Já Eduardo Paes está em seu segundo mandato, de modo que não pode ser eleito novamente desta vez. O candidato o qual apoia, Pedro Paulo (PMDB), por ora não atinge os dois dígitos de intenção de voto em pesquisas – o senador Marcelo Crivella (PRB), o deputado estadual Marcelo Freixo (Psol) e a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB) estão à frente do candidato de Paes. Conforme a campanha for avançando e a população associando o nome de Pedro Paulo ao de Paes, é provável que o peemedebista melhore nas pesquisas.

De qualquer forma, na avaliação do professor Emerson Cervi, é muito difícil que das eleições municipais deste ano surja uma figura que se alce logo à condição de liderança nacional. “Na história eleitoral do Brasil poucos prefeitos conseguiram projeção nacional diretamente. Normalmente a Prefeitura é o ponto de partida para o Congresso ou Governo do Estado, e a partir daí para o cenário nacional. O que os prefeitos fazem é, no máximo, conseguir se reeleger. Se fizer isso, já está de bom tamanho para eles”, considera o cientista político.

 

PRINCIPAIS MUDANÇAS

Principais regras estabelecidas pela minirreforma eleitoral:

  • Filiação partidária: até 2 de abril último (antes o cidadão precisava estar filiado a um partido político um ano antes do pleito)
  • Período de campanha: 45 dias (antes eram 90 dias)
  • O período de propaganda dos candidatos no rádio e na televisão também foi diminuído, de 45 para 35 dias, com início em 26 de agosto, no primeiro turno. A campanha terá dois blocos no rádio e dois na televisão com dez minutos cada. Além dos blocos, os partidos terão direito a 70 minutos diários em inserções, que serão distribuídos entre os candidatos a prefeito (60%) e vereadores (40%). Em 2016, essas inserções somente poderão ser de 30 ou 60 segundos cada uma.
  • Financiamento empresarial a candidatos está proibido. Só é permitido o financiamento de pessoas físicas (no máximo 10% do rendimento bruto do doador) e, ainda, por meio de recursos do Fundo Partidário.
  • As candidaturas terão teto máximo para as despesas definido com base nos maiores gastos declarados nas eleições municipais de 2012 (dentro da respectiva circunscrição eleitoral).

Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE)

 

NÚMEROS DAS ELEIÇÕES

  • 144.088.912 eleitores no Brasil
  • 5.568 municípios
  • 92 municípios com mais de 200 mil eleitores
  • 2 de outubro, data do primeiro turno
  • 30 de outubro, data do segundo turno (municípios com mais de 200 mil eleitores onde o primeiro colocado não atingir 50% mais um dos votos válidos)

Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE)